“Eu gostava de Gerry Healy...”
A Escola de Robertson de Construção de Partido
A Escola de Robertson de Construção de Partido
Esta é a tradução para o português de um artigo da Tendência Bolchevique publicado em meados de 1986 que discute a destruição do Partido Revolucionário dos Trabalhadores britânico (WRP) dirigido por Gerry Healy e a degeneração organizativa e política da Liga Espartaquista dos Estados Unidos (SL). O texto mostra como o tipo de degeneração burocrática da SL não é uma exclusividade sua. Também discute como a saúde organizativa de um grupo é uma questão política da mais importante e que pode preceder a degeneração de aspectos programáticos formais. A tradução foi realizada pelo Reagrupamento Revolucionário em fevereiro de 2011 com base na versão disponível em bolshevik.org.
A poeira só está começando a baixar após a maior (e mais suja) explosão na história recente entre os pretendentes internacionais ao trotskismo: a espetacular ruptura do Partido Revolucionário dos Trabalhadores britânico (WRP). Gerry Healy, “líder-fundador” do WRP, e Michael Banda, o seu braço-direito de longa data, romperam da forma mais asquerosa no fim de outubro passado. Banda ganhou o grosso da militância, o aparato real do partido e a planta de impressão; Healy manteve os Redgraves (as estrelas de cinema Vanessa e seu irmão Corin) e com eles o que restou da principal fração “operária” do WRP – no Sindicato dos Atores. Eles racharam até mesmo os satélites; os norte-americanos optaram pelos realizadores do motim, enquanto os gregos e espanhóis ficaram do lado do líder infalível.
Toda a história começou em julho passado, quando Banda e Aileen Jennings, secretário pessoal de Healy, e outros “companheiros chegados” iniciaram um golpe palaciano com alegações de que as atividades sexuais de Healy com 26 mulheres membros do partido representavam um risco de segurança em potencial para a organização. (Isso por si só é extremamente irônico, já que Healy foi por anos um dos maiores praticantes mundiais de um fetichismo fraudulento por “segurança” como uma maneira de caluniar seus oponentes políticos como agentes infiltrados no movimento dos trabalhadores). Healy supostamente teria aceitado isto e proferido sua retirada da liderança ativa do grupo, que seria declarada oficialmente em razão dos seus longos serviços e saúde debilitada.
Mas Healy passou as primeiras semanas da sua “aposentadoria” organizando a maioria do Comitê Político do WRP para um contra-ataque. Banda apelou para o Comitê Central (onde aparentemente ele ainda tinha maioria segura) e imediatamente expulsou Healy. Banda deu continuidade a isso publicando um relatório lúgubre das alegadas explorações sexuais abusivas de Healy, e outros malfeitos burocráticos, no Newsline, o jornal do WRP que possuía uma circulação diária. Os apoiadores de Healy se reagruparam e logo lançaram o seu próprio Newsline, que anunciava a expulsão de Michael Banda do WRP de Healy. Conforme a polêmica esquentou, ambos os lados acusaram um ao outro de “revisionismo” e trocaram acusações de “idealismo subjetivo”, “pragmatismo” e vários outros epítetos do dicionário de pseudo-dialética obscurantista que há muito tempo era uma especialidade do WRP. Mas havia na verdade apenas uma questão: qual galo iria mandar no galinheiro, ou melhor, na sede do WRP em Clapham.
As revelações espetaculares de Banda sobre a conduta sexual de Healy receberam atenção considerável da imprensa britânica e parecem ter espalhado interesse sobre os acontecimentos internos do WRP em muitos que normalmente não prestam lá grande atenção em tais coisas. Mais surpreendentemente ainda, um candidato do WRP a presidente do poderoso Sindicato Unido dos Trabalhadores de Engenharia recebeu colossais 15 mil votos na semana em que o escândalo foi anunciado. Brian Behan, irmão do autor irlandês Brendan, e um antigo membro de liderança do grupo de Healy que saiu da organização nos anos 1960, perguntou ironicamente: “Que cidadão inglês em sã consciência não iria querer entrar no partido de Healy, dada a sua atitude aberta para com a promiscuidade? Eu estive tentando estrar em contato com ele a semana toda.” (Sunday Times, 10 de novembro de 1985).
O racha do WRP só pode ser visto como uma coisa boa para o movimento revolucionário na Grã-Bretanha e em todos os outros lugares onde Healy opera. A confissão largamente reproduzida de Banda sobre os ataques físicos de longa data praticados por essa organização contra seus críticos, ambos internos e externos, e a sua completa prostituição ao governante da Líbia, Muammar Kadafi, e vários outros bonapartistas reacionários do Oriente Médio, só podem acelerar o necessário, e demasiado demorado, desaparecimento de ambas as alas desse bando de cínicos abomináveis e repulsivos.
SL: Healyismo Sui Generis
O grave racha na organização de Healy foi naturalmente comentado pela maioria das tendências que reivindicam o trotskismo. Mas nenhuma prestou mais atenção do que a Liga Espartaquista centrada nos Estados Unidos (SL), que publicou rapidamente uma edição de 64 páginas da sua revista teórica em inglês devotada a essa questão. Há várias razões para tamanha atenção. O grupo Espartaquista se originou no começo dos anos 1960 como a oposição de esquerda dentro do Socialist Workers Party [Partido dos Trabalhadores Socialistas] dos EUA, que se movia cada vez mais à direita, e considerou a Liga Trabalhista Socialista britânica (SLL – precursora do WRP) de Healy como sua liderança internacional. Logo no começo (em 1962) Healy deu aos seus apoiadores norte-americanos um gostinho das suas táticas organizativas “linha-dura” quando ele rachou a tendência em cima de recusa da maioria em se colocar sob seu comando organizativo. Quatro anos depois, na infame “Conferência de Londres”, a SL e os healyistas finalmente se separaram quando o líder da SL James Robertson se recusou novamente a se submeter às ideias burocráticas ultrajantes de Healy sobre “disciplina” na sua internacional.
Esta é parte da razão de por que a SL mostrou interesse tão intenso na ruptura dos healyistas. Mas há outra razão mais constrangedora para Robertson cobrir o racha na liderança do WRP tão ostensivamente. É a tentativa de estabelecer tanta distância quanto possível entre o seu estilo de liderança política e aquele do seu mentor de outrora. Um largo espectro de antigos quadros do grupo de Robertson apontou que o modelo das abomináveis práticas organizativas atribuídas ao WRP nas páginas de Spartacist, a revista teórica da SL, se encaixa bastante confortavelmente na própria SL.
A organização de Healy era infame pela sua manutenção da “disciplina” interna por meio de agressões físicas aos seus críticos e oponentes. Isso é algo de que a SL não é culpada no nosso conhecimento. Nós notamos, porém, que dentro da organização demonstrações desse apetite são crescentemente comuns. Em uma carta escrita após a sua saída, um antigo membro do satélite britânico da organização de Robertson notou a tendência do grupo em ver oponentes na esquerda como inimigos de classe:
“De acordo com o tesoureiro nacional, [dois antigos membros] ‘foram para o lado da burguesia’. Esta é a posição da organização? Parece que sim. Eu acredito que isso consiste na mais recente ilusão paranoica sobre uma ‘panelinha de desertores’ comprometida com a destruição da SL/B [Liga Espartaquista/Grã-Bretanha]. A ideia de que pessoas que perderam a esperança com a monotonia da SL/B são inimigos ativos da organização e, portanto, com uma simples operação de lógica sectária, agentes da burguesia, é ao mesmo tempo ridícula e perigosa. Talvez vocês possam explicar por que Len disse [para um antigo membro] para que ele se lembrasse do que momentos de radicalização violenta costumam fazer com ‘pessoas como ele’. Ou por que Ed se sentiu compelido a dizer [para outro membro] que ‘se nós estivéssemos em [outro país] nós iríamos arrebentar você’. Observações banais num momento de irritação? Talvez. Mas então todas as medidas são a princípio permitidas contra o inimigo de classe, não é? E o que quer dizer concretamente ‘ir para o lado da burguesia? ’.”
Se os membros, ex-membros ou oponentes da SL na esquerda são de fato “racistas”, “fascistas”, “amantes de nazistas”, “fura-greves” ou “provocadores do COINTELPRO [FBI]” (calúnias que a SL tem lançado com crescente frequência contra os seus adversários declarados, incluindo nós, nos anos recentes) então a questão sobre que medidas são permissíveis para combatê-los é de fato apenas uma “questão tática”. A SL surgiu como um agrupamento distinto e separado dos healyistas principalmente em oposição às táticas corruptas da liderança da SLL. Ela posteriormente passou por uma longa evolução de volta a muitas das técnicas que ela uma vez rejeitou. Hoje a SL é uma formação qualitativamente idêntica à SLL dos anos 1960. Vale a pena notar que a “descoberta” da iSt [Tendência Espartaquista Internacional] de que os seus membros de base eram no fundo racistas, fascistas e indivíduos com conexões sinistras com a polícia, foi feita apenas bem recentemente. Esta é uma das provas decisivas da decadência final da liderança da SL ao gangsterismo político.
Vida Interna na SL e no WRP
Uma das distinções superficiais que podem ser feitas entre a SL e os healyistas é a função do líder máximo. Enquanto Healy foi proeminentemente retratado na literatura e atividade pública do WPR por anos, o status de Robertson como o guru idiossincrático da SL é mais para consumo interno. Apesar disso, os fundamentos da “questão do partido” tem sido os mesmos em ambos os grupos por anos. Em ambas organizações toda a autoridade vem do líder supremo, e a devoção ao califa é a mais importante questão política.
Robertson refinou e melhorou as técnicas de Healy para a supressão de dissidentes internos. Na SL já são 18 anos desde a última luta fracional. Joseph Seymour, o intelectual de Robertson posicionado “acima das disputas” empreendeu em 1978 uma tentativa de oferecer uma explicação “marxista” para esse fenômeno particular. De acordo com Seymour, a vida fracional árida dentro da SL “é condicionada pelo fato da ausência de circunstâncias objetivas que exigem mudanças maiores ou inovações na linha política ou viradas organizativas não antecipadas”. Já faz oito anos desde que isto foi escrito e ainda nada no mundo real teve impacto suficiente para produzir qualquer dissidente interno na SL. Assim como Healy tentou quebrar Robertson em Londres em 1966, qualquer um que seja considerado capaz de se tornar um oponente fracional na SL é quebrado e/ou dispensado de uma forma ou de outra muito antes de levantar quaisquer divergências.
Diferente da Liga Espartaquista, o grupo de Healy tem tido uma série contínua de oposições políticas, algumas das quais foram ao menos autorizadas a escrever documentos e oferecer relatórios contrapostos nas conferências do partido. Em 1971, o grupo de Blick-Jenkins rompeu para entrar no Partido Trabalhista quando os seus colaboradores internacionais – os antigos parceiros de Healy na Organização Comunista Internacionalista francesa [dirigida por Pierre Lambert] – romperam relações com a SLL. (Na edição de 6 de dezembro de 1985 de New Statesman, Robin Blick lembrou como nessa ocasião ele foi “socado e sua cabeça batida contra a parede”). Em 1974, Allan Thornett liderou mais de cem pessoas para fora do WRP para formar a organização centrista Liga Socialista dos Trabalhadores (WSL). Cinco anos depois, uma pequena oposição fracional, liderada por Royston Bull, um antigo escritor da equipe do Newsline, deixou o WRP. Bull, por sua própria conta, conseguiu sobrevier por cerca de quatro anos como um oposicionista ocasional antes de finalmente decidir pular do barco.
A descrição de Bull do regime interno do WRP tem uma semelhança evidente com a SL hoje:
“Uma falha marcante do WRP é a sua incapacidade para construir uma coluna estável de quadros proletários ou de juventude capazes de liderar qualquer seção do movimento de massas.”
“O comandismo categórico sem fim da liderança cria doutrinários inflexíveis que são incapazes de sentir ou reagir às mudanças no movimento de massas. A motivação principal da vida dos quadros do WRP é a dependência com relação à liderança e assim, o próprio impulso que dá vida a um quadro revolucionário, a sua prática partidária dialética com o movimento dos trabalhadores, que envolve tomar decisões por conta própria, corrigir erros, liderar lutas, etc. é totalmente ausente. Essa relação burocrática sem vida entre o partido e seus quadros estrangula qualquer chance de crescimento real e recrutamento entre os trabalhadores e a juventude.”
— “O Partido dos Trabalhadores e a Luta pelo Restabelecimento das Tradições Bolcheviques”, outubro de 1981.
Um antigo membro dos espartaquistas, não associado atualmente com a Tendência Bolchevique, fez algumas observações memoravelmente similares sobre a vida no grupo de Robertson:
“Não é acidental que os membros como um todo são permeados de medo (da liderança) e exibem massiva confusão política. O estado dos membros reflete a paranoia desenfreada da liderança. Incapaz de estabelecer qualquer perspectiva concreta, a liderança crescentemente volta suas energias para o ‘processo de manutenção interna’...”.
“Os membros são mantidos num estado de ignorância forçada. Desprovidos de educação política, formal ou informal, desestruturados por uma agenda sobrecarregada (em grande parte de serviços administrativos maçantes prestados à organização), os membros são levados a aceitar o programa de papel da SL (quer eles o entendam quer não) ou são denunciados. Você percebe... que virtualmente ninguém discute política fora das reuniões formais? Você está ciente de que a maior parte dos membros nem mesmo lê os jornais que não sejam da imprensa de [um oponente na esquerda]?”
Em um discurso reimpresso na edição de novembro de 1985 de Jovem Spartacus, o porta-voz da SL Ed Clarkson critica os membros da Liga da Juventude Spartacus [juventude da Liga Espartaquista] por “insegurança baseada em ignorância”. Clarkson se impressiona com o fato de que “o que nós tendemos a ter nas disputas da juventude são confissões e denúncias, ao invés de lutas esclarecedoras”. Clarkson prosseguiu dizendo à juventude que:
“Se vocês forem se desenvolver na forma como Lenin propôs, isso exige, no nível individual, alguma capacidade de autoconfiança, que era a marca da juventude, mas que parece estranhamente ter desaparecido por volta da última década. Isso significa que vocês devem agir como se soubessem o que vocês estão fazendo. De fato, devem ser até bastante arrogantes nesse aspecto, e talvez nós tenhamos algumas boas disputas então.”
Mas a juventude viu “boas disputas” demais no estilo SL para desejar estar na lista negra de uma. A razão para a vida interna da Liga da Juventude Spartacus ser feita de “confissões e denúncias” é porque isso foi tudo que eles aprenderam. As “disputas” dos dias de hoje no grupo de Robertson são conduzidas ao longo de sessões de “crítica/autocrítica” como as da Guarda Vermelha chinesa – denúncias orquestradas pela liderança que são seguidas de confissões dos membros.
‘Capatazes servis desprovidos de capacidade revolucionária’
A análise de Spartacist da vida interna do WRP aponta que esta também consistia largamente de “confissões e denúncias”:
“Houve uma destruição sistemática de quadros: abusando deles politicamente e depois mantendo-os num estado de isolamento como fracos, quebrando o seu auto-respeito ao extrair deles falsas confissões, usando a sua lealdade aos ideais professados de socialismo para torna-los cúmplices em crimes contra seus próprios camaradas e os camaradas de outros grupos”.
Os healyistas não tem monopólio de tais técnicas para a destruição da fibra moral dos quadros. Aqui está um relato de uma testemunha ocular de um pouco de “construção de partido” na afiliada britânica de Robertson em meados de 1982:
“A SL/B, de acordo com a liderança internacional, ‘estava em muito boa forma’. Esta caracterização esteve correta até o curso de formação nacional de agosto de 1982. Então algumas semanas depois tudo foi por água abaixo. A liderança da SL/B acabou que era culpada de racismo. Desde uma organização saudável ao racismo em poucas semanas – isso deveria deixar até mesmo o observador mais bobo um pouco suspeitoso!”
“Uma enorme delegação internacional viajou para ‘descobrir’ o que estava acontecendo na Grã-Bretanha... A estrutura de poder seria quebrada e uma nova e diferente liderança seria eleita. Exceto pelo fato de que a velha liderança foi deixada intacta com a adição de alguns elementos mais abusivos da base. E David [o antigo dirigente] foi reduzido a um colapso emotivo. Eu não acho que algum dia vou me esquecer da reunião do CEI [Comitê Executivo Internacional] que precedeu a plenária. David se apresentou para falar na sua vez. Ele ficou na frente como uma figura patética, seus movimentos estranhamente mecânicos como se ele desesperadamente tentasse tirar algumas palavras da boca. O som do silêncio só foi interrompido pelo som de vários membros do CEI proferindo piadas e tolices. Quando as risadas diminuíram e toda atenção se focou em David, incapaz de falar ele começou a chorar e voltou para o seu lugar. Quando ele voltava alguém gritou ‘nos escreva uma carta’. ‘David... está em um estado muito emotivo’ proferiu Jim Robertson. Sem dúvida, indiferença a esse tipo de coisa é a marca de um verdadeiro ‘bolchevique’ da SL/B... ‘Preservação dos quadros’: não me faça rir.”
A liderança internacional conduziu “disputas” semelhantes na maioria das supostas seções independentes restantes da organização internacional. Isso não impediu Spartacist de expor de forma indignada o centralismo burocrático que prevalecia na “internacional” de Healy, nem de tirar lições corretas abstratas da história da Internacional Comunista:
“A importância do direito de as seções nacionais, dentro dos limites de um programa unitário internacional, fazerem as suas próprias escolhas táticas e escolher sua liderança é demonstrada pela degeneração da Internacional Comunista sob Stálin, que reduziu as lideranças nacionais a capatazes servis ao Kremlin, incompetentes e desprovidos de capacidade revolucionária”.
A validade dessa observação é demonstrada no caso da iSt, pela atividade centralizadora de Nova Iorque sobre a dúzia de outros núcleos estrangeiros estagnados da SL/EUA (vulga “tendência Espartaquista internacional”). Talvez o exemplo mais forte disso tenha ocorrido na Grã-Bretanha durante as semanas do conflito das Falklands/Malvinas com a Argentina em 1982, quando a SL/B realizou um fórum para discutir a situação no sindicato de trabalhadores de transporte e Nova Iorque! Quando um antigo membro sugeriu que o fórum deveria ser adiado para poderem debater a aventura militar imperialista que estava acontecendo no Atlântico Sul, lhe informaram que fazer isso seria ser “regionalista”!
Ziguezagues e Giros
Uma característica distintiva dos mercenários políticos healyistas é a sua capacidade para realizar giros políticos abruptos e desarticulados. Esse padrão também se tornou uma característica da SL. Em 1981, por exemplo, depois de lançar uma campanha de recrutamento baseada em apenas três pontos programáticos (um dos quais era “jamais atravessar piquetes”), a liderança da SL anunciou que a posição “interna” do grupo na luta de vida ou morte entre o sindicato dos controladores de voo norte-americanos e a administração Reagan era “não há problema em viajar de avião”. Aqueles que foram contra essa política foram colocados para fora do grupo sem aviso prévio. Viajar de avião durante a greve se tornou uma forma de demonstrar “lealdade ao partido” e muitos camaradas até mesmo agendaram voos para viagens que normalmente eles teriam feito de carro.
Em julho de 1984, a liderança “única a estar correta” da SL anunciou o perigo de um iminente golpe de Estado fascista contra a convenção nacional do Partido Democrata em São Francisco – e se voluntariou para mandar uma dúzia de guardas de defesa para evita-lo. Dez meses depois, após ganhar uma disputa judicial fora das cortes a respeito da investigação do FBI sobre a Liga Espartaquista, Workers Vanguard anunciou que todos os membros da SL iriam, daquele momento em diante, receber cartões de membros assinados indicando a data em que haviam se unido ao grupo. Dificilmente uma medida apropriada para um período em que a supressão da democracia burguesa é um perigo imediato.
Alguns meses depois, Robertson e seus quadros se vestiram com chapéus de bruxa, máscaras de porco e uniforme nazista e marcharam por um campus universitário de São Francisco como “Os Vingadores Vermelhos de Xandra” para impedir uma suposta armação do conselho de burocratas estudantis (e do FBI). Todos esses giros foram inevitavelmente aplaudidos na organização Espartaquista com uma demonstração unânime de entusiasmo por aqueles desejosos de permanecer no grupo. Os membros foram levados a aceitar que a realidade social é qualquer coisa que Robertson disser que é.
Pronunciamentos arbitrários e erráticos são característicos de cultos carismáticos, incluindo os políticos. Em um artigo na edição de 17 de junho de 1983 de Times Higher Education Supplement há muitos anos atrás, Roy Wallis observou que numa tentativa de impedir ameaças “a sua autoridade livre e sem obstáculos”, líderes supremos de vários tipos tendem a introduzir:
“mudanças imprevisíveis e exigências [sobre seus seguidores]. Isso pode tomar várias formas – frequentemente mudanças de ambiente, remoção de laços com fontes de apoio externas estáveis; enfraquecimento de laços estáveis entre casais e grupos dentro do movimento, por exemplo, quebrando laços sexuais exclusivos entre os membros; enfraquecendo relações de autoridades (que não as diretamente com o grande líder) que pudessem competir pela lealdade dos membros; introdução de novas crenças e práticas que fornecem oportunidade para os seguidores demonstrarem o seu compromisso, ou a falta dele, para com quaisquer questões que venham à cabeça do líder...”.
“Os ‘infiéis’ podem ser provocados a se declarar pela constante imposição de novas exigências, que levam ou ao protesto e exclusão ou à desistência. Tais abalos periódicos da rotina produzem entre os membros que sobrevivem uma sensação de liberação, de nova liberdade, uma sensação de excitação e frequentemente de renovado entusiasmo e de zelo e, mais importante, de um compromisso reforçado com o líder...”.
“O processo então tende a se auto-reforçar, levando em direção ao aparecimento de aspectos cada vez mais obscuros da identidade do líder, libertando desejos primários mais profundos, conforme as inibições sobre a sua indulgência são removidas. Enfraquecer estruturas institucionais e padrões não apenas constitui mudança e elimina as barreiras para mais mudanças, como também cria ambiguidades e conflitos de política e prática que deixa os membros sem um rumo claro de ação. Apenas observando constantemente o líder, se subordinando totalmente à sua inspiração do momento, e estando dispostos a se humilharem por sua falha em seguir tal inspiração bem o suficiente, podem os membros permanecer entre os favoritos”.
Manipulação e Assédio Sexual
Sexo é sempre uma boa forma de vender jornais e a imunda imprensa britânica teve um dia de festa com o racha no WRP. “Um Comunista Roubou Minha Esposa” e “Os Pesadelos Sexuais das Garotas de Gerry” foram manchetes típicas dos tabloides da imprensa. O fato de que Healy, de 73 anos de idade, teve relações sexuais com 26 (ou mesmo 260) mulheres não seria em si nenhum crime, apesar da lasciva acusação de Banda de uma “moralidade revolucionária”. Um jornalista britânico apontou que mesmo se Healy tivesse tido o dobro de parceiras do que Banda afirma ter havido, isso teria significado “menos de duas por ano, o que seria uma rotina calma para um ‘pegador’” (Sunday Times, 10 de novembro de 1985). A decisão de Banda de ir à imprensa burguesa com os contos devassos da vida sexual de Healy, que o Times caracterizou como “uma quebra bastante incomum das regras de etiqueta trotskistas” (2 de novembro de 1985) sugerem que o “novo” WRP se mantem firmemente na tradição sórdida do antigo. Mais importante, o WRP de Banda parece ter mantido tais acusações de forma deliberadamente vaga – combinando denúncias puritanas revoltantes das alegadas infidelidades matrimoniais de Healy (“devassidão sistemática”) com alegações de coerção e “investidas sexuais”. A afirmação de Banda de que “ele conhecia o Sr. Healy havia 35 anos, mas só recentemente descobriu sobre seu suposto mau comportamento” (Times, 30 de outubro de 1985) não pode realmente ser levada a sério.
A questão das atividades sexuais consensuais dos membros de qualquer organização não é, em si, uma questão política, mas um assunto pessoal entre os indivíduos envolvidos. No entanto, como é levantado por Sean Matgamna em seu artigo sobre o racha do WRP no Socialist Organizer (reimpresso em Workers Vanguard, 15 de novembro de 1985), “É certo como dois e dois são quatro que nessa organização [o WRP] o aproveitamento sexual, e junto com ele o necessário assédio, intimidação ou pior, eram parte do modo de vida do líder”. Para aqueles que vivem em um micro meio social no qual é impossível discordar de um líder infalível sem correr risco de excomunhão, onde a realidade só pode ser interpretada com base nos seus pronunciamentos “que são os únicos corretos”, a questão da consensualidade está ao menos aberta ao assédio. Mulheres que caiam no gosto do líder, mas que não sejam recíprocas na sua atenção são passíveis de ser subjugadas a uma considerável pressão, sutil ou não tão sutil. Na SL, a liderança em algumas ocasiões caracterizou “politicamente” tais membros como “piranhas frígidas”. Nos locais de trabalho burgueses, esse tipo de coisa é chamado de “assédio sexual”. É um aspecto nojento, mas dificilmente surpreendente, da vida em seitas políticas de obediência.
Como tudo mais na SL degenerada, a questão da “consensualidade” está sujeita a interpretações dependendo de quem está fazendo o que com quem. Alguns anos atrás, um dirigente visitante da franquia de Robertson na Grã-Bretanha, que passeava pelos Estados Unidos, teve o mau julgamento de dar em cima de várias companheiras dos líderes da SL, incluindo a esposa de Robertson. Esse “crime” foi, sem demora, usado como uma evidência da sua completa degenerescência numa subsequente campanha para expulsá-lo. Na SL não há crime maior do que ofender sua majestade, seja isso consensual ou não.
O Coral Susanna Martin
A afirmação de Banda de não ter sabido nada das atividades extraconjugais de Healy é obviamente tão hipócrita quanto as suas declamações sobre “moralidade socialista”. Aspirantes a Banda no Secretariado Político da SL não serão capazes de fazer tais afirmações. A existência de uma equipe de queridinhas de Robertson não é nenhum segredo. Elas têm até mesmo um nome: o “Coral Susanna Martin” (Susanna Martin foi uma bruxa que viveu nos Estados Unidos). Vestidas de preto, e carregando velas, elas fizeram uma apresentação diante dos delegados da Conferência Nacional de 1983 da SL. Workers Vanguard mencionou o desempenho dessa “associação de interesse privado” no seu balanço sobre a conferência (18 de novembro de 1983). Além de ser estranho e típico de uma seita, tal tipo de atividade faz lembrar convenções políticas burguesas, onde os delegados, tendo pouca influência na direção política do seu partido, são distraídos por uma apresentação sensacionalista. Na SL tais “associações de interesse privado” são de prerrogativa exclusiva do líder carismático. Outros membros foram atacados por “fazer panelinha” ao receber pessoas para jantar, socializar informalmente sem convidar a liderança, ou mesmo por falarem entre si no telefone “pelas costas do partido”. O outro lado da moeda do “Coral Susanna Martin” de Robertson é que líderes (homens) secundários no grupo foram periodicamente acusados de “manipular sexualmente” membros mulheres. Tipicamente isso envolve a “descoberta” de que o indivíduo em questão, que foi sempre insensato o suficiente para entrar na “lista negra”, estava dormindo com alguma mulher do grupo com a qual ele não era casado. Em um caso de nosso conhecimento, “manipulação sexual” foi alegada sem qualquer evidência sequer de que havia havido qualquer transgressão ao sétimo mandamento. Quando o acusado questionou como essa acusação poderia ser feita quando ele a negava, e todas as suas supostas vítimas a negavam, ele foi informado de que esse era o pior tipo de manipulação – ela tinha sido tão bem feita, que mesmo sob considerável pressão do partido, as próprias vítimas não conseguiam ver o que havia acontecido! Essa é a característica de “Alice no País das Maravilhas” da vida interna “ricamente democrática” da tendência Espartaquista. Manipulação sexual, como todo o resto na SL, significa exatamente aquilo que a liderança quiser que signifique.
A Questão do Dinheiro
Uma das questões tocadas pela disputa no WRP foi dinheiro. No caso dos healyistas, envolveu centralmente a prática totalmente corrupta de “se alugarem” como propagandistas para vários ditadores do Oriente Médio, uma prática que isolou o WRP do movimento dos trabalhadores há muitos anos atrás. Matgamna cita relatos na imprensa burguesa de que “militantes do Iraque que vieram para uma reunião do WRP foram depois entregues ao regime iraquiano, que os assassinou. Banda é citado dizendo que o motivo disso era conseguir ‘pacotes de dinheiro’”. Há outro ângulo da questão financeira e na forma como ela se relaciona com o regime de Healy além do local de onde o dinheiro veio. Isto é, quem gastou quanto com o que, e a quem eles prestaram contas. O London Times relatou em 30 de outubro de 1985 que “os apoiadores do Sr. Banda... foram acusados ontem de serem culpados de causar uma crise no partido por inventar os balanços financeiros”. Banda supostamente teria acusado Healy de ter feito um desvio de 20 mil libras e de ter comprado um BMW de 15 mil libras para si próprio com dinheiro do WRP. O artigo da Liga Espartaquista observa que “Nossa própria experiência também demonstra que Healy sempre foi fixado em dinheiro”. E quanto a ti, James Robertson?
A questão do dinheiro em uma organização altamente burocratizada é inevitável e particularmente sensível. A liderança guarda mesquinhamente o seu monopólio do cofre e geralmente é extremamente adversa a qualquer sugestão de prestar contas aos membros de base. Qualquer membro ingênuo ou impertinente o suficiente para perguntar a Healy ou a Robertson pelos livros de contabilidade iria rapidamente aprender que (a) é impossível por razões de “segurança” e (b) tal questão envolve falta de confiança na liderança, ou seja, uma “atitude anti-partido” (que geralmente é fatal).
Na entrevista especial com Robertson sobre a Conferência de Londres de 1966, um dos seus falsos entrevistadores bajuladores perguntou “Quando você desenvolveu o slogan ‘o que Healy fizer, faça o contrário’?”. Isso é de fato uma piada amarga para aqueles que experimentaram em primeira mão o “anti-healyismo” estilo SL. Robertson respondeu com uma enorme propaganda de seu regime “maravilhosamente compassivo”. Ele contrastou a técnica healyista de dobrar a carga de trabalho sobre camaradas exaustos, com o seu próprio método em situações assim: “Bom, camaradas, tirem algumas férias agora. Vão fazer mergulho, ou viajem para Portugal, ou alguma outra coisa. Paguem com o seu dinheiro aquilo que vocês puderem e talvez o tesouro do partido possa ajuda-los”. Com as extorsivas cotas da SL, a maioria dos membros mal pode manter um carro ou comprar roupas, quanto mais sair de férias. Para aqueles que, aos olhos da liderança, estão “se saindo bem” é outro assunto. Eles podem realmente tirar férias em Portugal por cortesia do tesouro do partido. Robertson, segundo relatos recentes, manteve um fundo pessoal bem gordo para tais contingências. Ocasionalmente sabe-se que ele cata bem fundo no tesouro do partido para comprar presentes caros para suas amigas.
Aqueles que estão “se saindo bem” são frequentemente convidados para jantar. Alguns líderes principais (como Robertson) até mesmo conseguem a construção de caros apartamentos em Manhattan para eles com fundos e trabalho dos membros do partido. Camaradas que não tem disponibilidade para cumprir funções no partido ou ir a mobilizações, são algumas vezes encorajados a fazer empréstimos para contribuir com a organização. Aqueles que forem bem vistos pela liderança podem depois receber ajuda em amortizações. Outros pagam em dinheiro.
A estrutura financeira da SL é projetada para reduzir todos os membros à penúria. Isso gera receita para o tesouro do partido e também tende a reforçar o desejo dos membros de se agraciarem com a liderança através de um sistema de recompensas materiais triviais. Aqueles que estão na folha de pagamento do partido [os militantes profissionais remunerados] são duplamente dependentes de permanecer bem aos olhos da liderança; punição por enganar “o partido” (ou seja, James Robertson) pode variar desde um corte no seu já miserável salário até mesmo a uma demissão imediata.
SL/WRP: a Questão do Regime Interno como uma Questão Política
Um dos novos pontos políticos introduzidos no especial de Spartacist sobre o WRP é uma tentativa de levar em conta o fato de que a degeneração da SLL do “trotskismo ortodoxo” ao gangsterismo político ficou primeiramente evidenciada nas suas práticas burocráticas internas. Esse é um ponto de considerável importância para a liderança da SL, que manteve como um artigo de fé o puro silogismo da “defesa” das suas próprias práticas internas burocráticas: (a) a superestrutura ou regime de uma organização política é derivada do seu programa político e, portanto, (b) um grupo com um programa revolucionário não pode, por definição, ser burocrático. De acordo com os líderes da SL, a questão do regime não é uma questão “política” independente e qualquer um que levante críticas organizativas sem ter um programa “político” completamente oposto é um baderneiro sem princípios.
No entanto, houve sempre uma disparidade entre essa posição e as conclusões que a SL tirou da sua experiência com Healy na Conferência de Londres de 1966: “o aparato de Healy e Banda subordina questões políticas reais de acordo e desacordo a exigências de interesse organizativo e políticas de prestígio pessoal. Essa tendência organizativa é por si só uma questão política de primeira ordem” (Spartacist, Junho-Julho de 1966).
A liderança da SL tenta resolver essa contradição na sua edição especial sobre os healyistas com a afirmação profunda de que a organização de Healy nunca foi um agrupamento revolucionário – embora por dez anos ela tenha sido o principal expoente internacional do trotskismo autêntico.
Robertson anuncia de maneira bastante irreverente na sua entrevista em Spartacist: “uma vez tendo encontrado a organização de Healy, eu não vi nela, de alto a baixo, nada de interessante de acordo com a minha compreensão de como uma organização comunista deve ser. E os healyistas de fato foram numa direção difusa.” Depois, Robertson oferece a sua opinião sobre o líder supremo da SLL: “Vamos ser claros: eu gostava de Gerry Healy, eu me dava bem com ele, nós convergíamos em todos os tipos de questão, comentários, nuances, táticas, como uma dupla de comunistas bastante rodados que já haviam passado por poucas e boas”. Aparentemente, Robertson ainda gosta de Gerry Healy. Em sua carta de novembro de 1985 de condolências a “Gerry”, Robertson afirma: “Eu não vejo nenhuma alegria no seu passado recente... eu lamento por você se você não ajudou a matar aqueles 21 comunistas iraquianos. E se você de fato não o fez, eu lhe desejo todo o bem”. A afeição de Robertson por Healy está enraizada na identificação profissional de um caudilho com outro – afinal de contas, eles estavam ambos no mesmo negócio, ainda que “Gerry” tenha exagerado um pouco aqui ou ali. Diferente de Robertson, nós certamente não desejamos nenhum bem a Healy, tenha ele ou não ganho “crédito” pelo assassinato dos militantes de esquerda iraquianos. É difícil imaginar que as vítimas do que Spartacist, em outro momento, descreveu como “terrível violência física contra os membros e crimes concretos contra a classe trabalhadora internacional” também lamentem.
Spartacist levanta a questão de como os healyistas passaram desde um grupo que produziu o documento “Perspectiva Mundial para o Socialismo” de 1961 (um documento que Robertson em sua entrevista descreve como a “mais clara expressão do programa básico do trotskismo internacional que nós havíamos visto em um longo tempo”) até uma seita de criminosos políticos. A explicação que é oferecida é muito pouco convincente:
“Nós ficamos de fora da pista impactados pelo lado literário deles por muitos anos, pelo sucesso de Healy em ganhar seções significativas do aparato sindical e educacional do PC Britânico para uma posição que reivindicava o trotskismo. Eles escreviam muito poderosamente. E levou algum tempo para que Gerry passasse por cima disso, se aproveitasse, e criasse um tipo de seita nojenta, putrefata e sufocante.”
Como foi que Gerry Healy foi capaz de ganhar várias centenas de quadros sofisticados do Partido Comunista para a “reivindicação” do trotskismo? E como foram esses “reivindicadores” do trotskismo capazes de produzir “talvez a melhor reafirmação do propósito de ser trotskista em língua inglesa desde a morte de Trotsky”? (prefácio da SL de 1970 para a segunda edição de “O que é uma liderança revolucionária?”). Se tudo era uma fraude e uma enganação desde o início, então porque levou algum tempo para “passar por cima” dessas características e “criar” uma seita?
A resposta é que o programa de uma organização é a totalidade da sua prática no mundo – não apenas a sua propaganda escrita formal. Isso necessariamente inclui o mecanismo de organização interna que dá forma às respostas do grupo aos desenvolvimentos da luta de classes, ou seja, a “questão do regime”. A caracterização que nós fizemos da Liga Espartaquista por volta de 1982 em nossa declaração fundacional poderia se aplicar com igual validade aos healyistas de meados dos anos 1960. Também ela era “uma organização com uma profunda contradição entre uma visão de mundo marxista e um programa coerente e racional, e um regime interno crescentemente abusivo (e irracional). E o processo pelo qual essa contradição [seria] resolvida, [estava] incompleto”. Nem na SL do começo dos anos 1980, nem nos healyistas de duas décadas antes, o regime interno do grupo era um produto automático do seu programa formalmente correto. Em ambos os casos, este estava em contradição com as políticas declaradas da organização.
Como nós observamos em “A Estrada para Jimstown”, na edição final do Boletim da Tendência Externa da iSt (número 4): “O burocratismo em última análise se opões ao programa revolucionário e deve eventualmente se expressar politicamente. Mas desvios programáticos formais não necessariamente precisam proceder uma degeneração burocrática”. Hoje a SL se desviou sistematicamente e repetidamente para longe da ortodoxia trotskista que ela uma vez defendeu, assim como Healy o fez no fim dos anos 1960. Dar “vivas” aos stalinistas cambojanos pró-Vietnã, como “verdadeiros comunistas”, viajar de avião durante a greve dos controladores de voo, caluniar oponentes e críticos na esquerda como “amantes de nazistas” e agentes de polícia, chamar pelo salvamento do braço colonial do imperialismo dos EUA no Líbano em 1983 – esses e outros desvios para longe do trotskismo, todos os quais ocorreram sem resistência interna significativa, foram antes preparados por uma atrofia da democracia interna do grupo e a sua consequente perda de capacidade de corrigir seus erros através de disputas políticas internas.
O que Robertson e companhia buscam negar com sua afirmação de que o grupo de Healy nunca foi revolucionário é uma conexão viva entre a “questão do regime” e o programa impresso formal que a organização diz defender. Mas a história da SL – assim como aquela da SLL/WRP antes dela – prova simplesmente o oposto.
Como o WRP, também a SL:
“(...) tem uma postura ‘trotskista’ que, apesar de fraudulenta, não deixa de ter significado para muitos membros. E a organização [de Robertson] fez frequentemente um trabalho competente ao expor a escória reformista e os confucionistas centristas que habitam a esquerda [internacional]; portanto, [a SL] é amplamente vista como ‘trotskista rígida’ em alternativa às traições da colaboração de classes.” – Spartacist, inverno de 1985-86.
Mas a tendência Espartaquista hoje é apenas a última de uma grande fila de organizações certa vez revolucionárias que, sob as pressões do isolamento e do fracasso, se transformaram em algo inteiramente diferente do que elas eram originalmente. Como o grupo de Healy, do qual rompeu há cerca de 20 anos, a SL permanece como um exemplo de que a degeneração de pequenos grupos de propaganda revolucionários podem algumas vezes tomar cursos estranhos e imprevisíveis. Assim como a SL levou adiante a luta para reforjar a Quarta Internacional apesar da tentativa de destruição de Healy na Conferência de Londres de 1966, hoje a Tendência Bolchevique pretende garantir a continuidade do trotskismo autêntico, incluindo as contribuições do grupo de Robertson, sobrevivendo à transformação de tal grupo em uma seita de obediência e de mercenários políticos.