Neutralidade Diante do Imperialismo
A
presente carta foi escrita pela então revolucionária Tendência Bolchevique
Internacional em 2003, como resposta a um panfleto assinado por “um grupo
informal de pessoas em Toronto partidárias de diferentes perspectivas
(anarquista, comunista e outras).” Sua tradução para o português foi realizada
pelo Reagrupamento Revolucionário em janeiro de 2013, a partir daquela
disponível em http://www.bolshevik.org/1917/no26/no26anarchist.html.
29 de janeiro de 2003
Camaradas:
O seu panfleto de 18 de
janeiro, “Contra a Guerra Capitalista! Contra a Paz Capitalista!”, levanta um
questionamento sobre a nossa posição na iminente guerra a ser lançada contra o
Iraque pela coalizão liderada pelos EUA: “De fato, a TBI defende militarmente o
regime [iraquiano] do Baath, enquanto não confere ‘nenhum apoio político a
Saddam Hussein’ – mas o que diabos isso significa?”. Ficamos felizes em poder
explicar.
Se você estiver “apoiando
politicamente” um indivíduo ou organização, isso significa que você concorda em
geral com ao menos algumas das ideias, programa e perspectiva que este
representa. “Apoio militar” significa que nós estamos tomando um lado em um
conflito particular, sem necessariamente endossar qualquer ou todas as
políticas ou ideologias daquele lado que apoiamos.
Se, por exemplo, um grupo
de anarquistas encontrasse um bando de nazistas atacando uma sinagoga cheia de
judeus devotos, deveriam eles recusar a se envolver porque o Rabi [sacerdote]
da congregação é um obscurantista religioso, ou porque a sinagoga foi
financiada pelo racista Estado sionista? Claro que não. Qualquer pessoa
consciente iria estar do lado da congregação judaica (incluindo o Rabi) contra
os nazistas. Isso não implicaria nem apoio à teologia judaica e nem aprovação dos
crimes de Israel contra os palestinos.
Se os trabalhadores de um
sindicato controlado por burocratas corruptos entram em greve contra uma
corporação perversa, ou se um conselho tribal aborígene liderado por carreiristas
com interesses particulares resiste a uma tentativa do governo de tomar suas
terras, os revolucionários não são neutros. Nós tomamos o lado dos oprimidos
contra os seus opressores apesar da sua liderança.
A economia mundial
capitalista opera através de um mecanismo de extração de riqueza da vasta
maioria da humanidade para o benefício de um punhado. Portanto, é necessário
distinguir entre países imperialistas ou opressores (Canadá, Estados Unidos,
França, Grã-Bretanha, etc.) e os países neocoloniais ou oprimidos (Jamaica,
Líbano, Colômbia, Iraque, etc.). A sua descrição da cruzada liderada pelos EUA
como uma “corrida imperialista para dominar as reservas de petróleo do mundo” e
uma “guerra genocida” contra o povo do Iraque faz implicitamente essa
distinção.
É verdade que a iminente
“guerra é uma expressão da competição capitalista”, apesar do fato de que o
Iraque não está competindo com os EUA. A tentativa dos Estados Unidos de tomar
o petróleo do Iraque tem o objetivo de aumentar o seu poder contra o Japão,
Alemanha e outras potências imperialistas. Quando a competição
interimperialista explodiu em conflito militar durante a Primeira e a Segunda
Guerra Mundial, os revolucionários não apoiaram nenhum lado, e chamaram os
trabalhadores em ambos os campos a reconhecer que o seu inimigo principal
estava em casa. Os marxistas não determinam sua política apenas com base na relativa
força dos combatentes. Os trabalhadores não tem interesse em defender potências
imperialistas mais fracas (Canadá, Bélgica ou Áustria) contra as mais fortes
(Estados Unidos, França ou Alemanha). E nem tomamos lado em conflitos entre
neocolônias, ou seja, Iraque vs. Irã nos anos 1980 ou Iraque vs. Kuait em 1990.
Mas, quando o imperialismo dos EUA organizou a invasão da Baía dos Porcos em
Cuba, em 1961, lançou mercenários contra os sandinistas na Nicarágua, ou
invadiu Granada e o Panamá nos anos 1980, os revolucionários certamente tomaram
um lado.
Deveriam os
revolucionários ter apoiado os republicanos irlandeses no Levante de Páscoa de
1916, que buscava expulsar os britânicos? Nós dizemos que sim. Quando o Jihad
Islâmico explodiu os quartéis das legiões de fuzileiros franceses e
norte-americanos no Líbano em 1983, nós dissemos que, apesar do caráter
politicamente reacionário da resistência nativa, eles tinham todo o direito de
expulsar os imperialistas do seu país. (Nessa ocasião, nós tivemos um agudo
desacordo com a Liga Espartaquista/TL [Liga Trotskista do Canadá], que
vergonhosamente não apoiou esta ação e chamou pelo salvamento das vidas dos
fuzileiros: veja nosso Boletim Trotskista No. 2).
Na Guerra Civil
Espanhola, ambos os anarquistas de esquerda e os trotskistas pegaram em armas
ao lado do governo republicano de frente popular, dominado pelos stalinistas,
contra os Nacionalistas fascistas de Franco. Mas, ao mesmo tempo, os
bolcheviques-leninistas trotskistas e os anarquistas Amigos de Durruti, ao
contrário da esquerda oportunista, permaneceram firmemente opostos ao governo
de frente popular e ativamente buscaram construir um movimento revolucionário
capaz de derrubá-lo. Os revolucionários hoje devem fazer uma distinção
equivalente e estar do lado militar do Iraque contra os agressores
imperialistas, enquanto permanecem intransigentemente opostos politicamente ao
sanguinário regime de Saddam Hussein. Isso não significa abandonar a
perspectiva de revolução proletária no Iraque, assim como o apoio militar ao
governo republicano durante a Guerra Civil Espanhola não significava renunciar
à luta para derrubar o domínio capitalista na Península Ibérica.
Saudações Comunistas,
Tendência Bolchevique
Internacional.